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ago/2012

Direito de greve dos servidores públicos após a “regulamentação” dada pelo Supremo Tribunal Federal

Por *Jarbas Arêdes Junior

O art. 37 da Constituição da República dispõe em linhas gerais sobre a administração publica, estabelecendo desde os princípios gerais a serem observados pela administração até a forma de ingresso dos servidores públicos. Em seu inciso VII o referido artigo dispõe acerca do direito de greve dos servidores públicos, porém, estabelece que há necessidade de regulamentação do referido direito por lei. Veja-se a redação do artigo 37,VII.

Art. 37 (…)

“VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica.”

Contudo, após vinte anos da promulgação da Constituição de 1988 o Congresso Nacional ainda não editou a lei para definir os limites e os termos para a realização de greve pelos funcionários públicos, em afronta a própria constituição posto que a inexistência da referida lei obstava o direito de greve assegurado em seu artigo 9º.

Assim sendo, na busca de uma solução que assegurasse aos servidores públicos o exercício do direito de greve tão eloqüente na iniciativa privada, o STF foi provocado em sede de mandado de injunção para dirimir as dúvidas existentes, desse modo, no último dia 25 de outubro o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento dos Mandados de Injunção (MIs) 670, 708 e 712, impetrados, respectivamente, pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindpol), pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do município de João Pessoa (Sintem) e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do estado do Pará (Sinjep).

O que se pretendia com as referidas ações era sanar a omissão do Presidente da República e do Congresso Nacional em regulamentarem o artigo 37, VII da Constituição Federal, ao mesmo tempo em que pretendiam que fosse assegurado o direito de greve para seus filiados, a despeito da indigitada inércia legislativa.

O STF, revendo seu posicionamento histórico de que o direito de greve de servidores públicos disposto no art. 37, VII, da CF/88, consubstanciava norma de eficácia limitada, carente de regulamentação, e que o mandado de injunção não se prestaria à edição de norma concreta integradora, não obstante a lentidão legislativa. Em outras palavras, o STF entendeu à época que não seria dado ao Poder Judiciário fazer as vezes de legislador e suprir a ausência de regramento ao direito de greve dos servidores públicos.

Desse modo, o STF ao proferir julgamento nos MIs 670, 708 e 712, não só censurou o legislador ordinário pela morosidade na regulamentação do inc. VII do art. 37, como também determinou que enquanto não for sanada a deficiência legislativa, dever-se-ia aplicar a Lei Geral de Greve (Lei nº 7.783/89), regulamentando provisoriamente o exercício do direito paredista.

DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS

A greve constitui manifestação social, levada a cabo por trabalhadores em geral, com o fito precípuo de angariar melhores condições remuneratórias e laborais.

O direito de greve foi agasalhado pela Constituição de 1988, atingindo além dos empregados privados, os servidores públicos civis. O sistema de direito constitucional positivo conferiu legitimidade jurídica à greve no âmago da Administração Pública, dela apenas excluindo, por razões de evidente interesse público, os militares das Forças Armadas e os integrantes das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares, aos quais se proibiu, terminantemente, o exercício desse direito de ação coletiva (CF, art. 42, § 5º).

Como antevisto, o STF decidiu que enquanto não editada lei especial, regente do movimento paredista dos servidores públicos federais, estaduais e municipais, incidir-lhes-á a Lei Geral de Greve – Lei nº 7.783/89. Para melhor visualizar a legalidade do direito de greve, veja-se a redação dos artigos 1º e 6º, § 2º da Lei nº 7.783/89:

Art. 1º – É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

(…)

Art. 6º – (…)

§ 2º – É vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.

É notável, que a Lei Geral de Greve ostenta dispositivos que militam a favor do movimento grevista. Por outro lado, a subsunção da indicada Lei aos servidores públicos, tal como desenhado pelo STF, pode promover um enrijecimento à prática de paralisações no serviço público.

Assim sendo, com efeito, a pretexto de salvaguardar o princípio da continuidade do serviço público, os Ministros da Suprema Corte impuseram várias restrições que foram inspiradas na Lei nº 7.783/89 e adaptadas aos casos de greve de servidores públicos, veja-se as regras que devem ser seguidas, sob pena de ser considerada ilegal a greve:

1) a suspensão da prestação de serviços deve ser temporária, pacífica, podendo ser total ou parcial;

2) a paralisação dos serviços deve ser precedida de negociação ou de tentativa de negociação;

3) a Administração deve ser notificada da paralisação com antecedência mínima de 48 horas;

4) a entidade representativa dos servidores deve convocar, na forma de seu estatuto, assembleia geral para deliberar sobre as reivindicações da categoria e sobre a paralisação, antes de sua ocorrência;

5) o estatuto da entidade deve prever as formalidades de convocação e o quorum para a deliberação, tanto para a deflagração como para a cessação da greve;

6) a entidade dos servidores representará os seus interesses nas negociações, perante a Administração e o Poder Judiciário;

7) são assegurados aos grevistas, dentre outros direitos, o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os servidores a aderirem à greve e a arrecadação de fundos e livre divulgação do movimento;

8 ) em nenhuma hipótese, os meios adotados pelos servidores e pela Administração poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem;

9) é vedado à Administração adotar meios para constranger os servidores ao comparecimento ao trabalho ou para frustrar a divulgação do movimento;

10) as manifestações e os atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa;

11) durante o período de greve é vedada a demissão de servidor, exceto se fundada em fatos não relacionados com a paralisação, e, salvo em se tratando de ocupante de cargo em comissão de livre provimento e exoneração ou, no caso de cargo efetivo, a pedido do próprio interessado;

12) será lícita a demissão ou a exoneração de servidor na ocorrência de abuso do direito de greve, assim consideradas: a) a inobservância das presentes exigências; e b) a manutenção da paralisação após a celebração de acordo ou decisão judicial sobre o litígio;

13) durante a greve, a entidade representativa dos servidores ou a comissão de negociação, mediante acordo com a Administração, deverá manter em atividade equipes de servidores com o propósito de assegurar a prestação de serviços essenciais e indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da coletividade;

14) em não havendo o referido acordo, ou na hipótese de não ser assegurada a continuidade da prestação dos referidos serviços, fica assegurado à Administração, enquanto perdurar a greve, o direito de contratação de pessoal por tempo determinado, prevista no art. 37, IX, da Constituição Federal ou a contratação de serviços de terceiros;

15) na hipótese de greve em serviços ou atividades essenciais, a paralisação deve ser comunicada com antecedência mínima de 72 horas à Administração e aos usuários;

16) a responsabilidade pelos atos praticados durante a greve será apurada, conforme o caso, nas esferas administrativa, civil e penal.

A Lei de greve estabelece quais são os serviços essenciais, os quais não poderá haver paralisação total, dentre os quais não se incluem a atividade exercida pela Policia Rodoviária Federal, contudo o STF ao estabelecer as regras acima, no item 13 utiliza-se da expressão serviços essenciais e indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da coletividade. Assim sendo, ante à falta de regulamentação específica, o pouco tempo de aplicação das novas regras e principalmente a natureza do próprio serviço público, sugere-se que seja devidamente observada a disposição do item 13 acima transcrito.

No que se refere à remuneração dos dias parados, o Min. Lewandowski inspirou-se na redação proposta ao art. 9º do Projeto de Lei 4.497/01, de relatoria da Deputada Rita Camata, para determinar que os dias de greve serão computados como de efetivo exercício para todos os efeitos, inclusive remuneratórios, desde que atendidas as exigências da Lei nº 7.783/89, e acaso, após o encerramento da greve, sejam repostas as horas não trabalhadas, conforme cronograma estabelecido pela Administração, com a participação da entidade representativa dos servidores.

CONCLUSÃO

A primeira conclusão que se pode extrair do julgamento em apreço é que diante da inexplicável morosidade do poder legislativo em regulamentar o artigo 37, VII da Constituição, o STF revendo seu posicionamento histórico atuou como verdadeiro legislador fixando, provisoriamente, as regras para o movimento paredista praticado por servidores públicos.

Contudo a regulamentação é frágil e há um grave problema, posto que não foi criado instrumento capaz de compelir a Administração a negociar, tampouco a cumprir os acordos celebrados.

Assim sendo, conclui-se que embora o STF tenha demonstrado enorme preocupação com os abusos pretensamente ocasionados pela falta da legislação grevista, deu as costas à eficácia e ao estímulo do gozo de um direito constitucionalmente previsto.

*Jarbas Arêdes Junior – advogado – OAB/MG 97.756

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