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abr/2012

“Lidar com o crime não é fácil”, diz chefe do Gaeco

Gaeco tem intensificado o combate à comercialização de drogas em Mato Grosso

Procurador de Justiça Paulo Prado assumiu a coordenação do Gaeco em maio de 2009

Atuando há 23 anos no Ministério Público do Estado de Mato Grosso, o atual coordenador do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), procurador de Justiça Paulo Roberto Jorge do Prado, tem uma rotina de trabalho estressante. Porém, graças à dedicação da equipe, o Gaeco vem impondo derrotas acachapantes ao crime organizado.

Em entrevista ao MidiaNews, ele disse que o Gaeco não deixou de lado o enfrentamento da corrupção. “A corrupção é o mal que faz com que o país seja atrelado ao subdesenvolvimento físico, moral, ético e espiritual”, afirmou.

Entretanto, fruto de um trabalho realizado nos últimos tempos, o Gaeco começou a focar suas ações no combate ao tráfico de drogas e ao cerco ao chamado “Novo Cangaço” (assaltos realizados a bancos no interior, com reféns e uso de armamento pesado), que tem espalhado terror em assaltos a bancos não só em Mato Grosso como em outros Estados.

Ele sustentou que é justamente esta nova modalidade que vem alimentando o tráfico de drogas e o contrabando de armas.

À frente da coordenação do Gaeco desde maio de 2009, Paulo Prado, que já exerceu por duas vezes o cargo de procurador-geral de Justiça de Mato Grosso, também reparte o tempo como procurador de Justiça titular da Procuradoria Especializada em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, além de ser membro do Conselho Superior do Ministério Público.

Confira os principais trechos da entrevista do procurador Paulo Prado:

MidiaNews – Atualmente, qual é a estrutura do Gaeco?

Paulo Prado – O trabalho do Gaeco conta com a grande parceria da Polícia Militar. Temos uma equipe de três promotores para atender a todo o Estado, além de mim, que sou o coordenador. São os doutores Marco Aurélio de Castro, Arnaldo Justino da Silva e Sérgio Silva da Costa. Também estamos construindo uma boa relação com a Polícia Civil e pretendo conversar com o governador Silval Barbosa para que ele designe um delegado para trabalhar junto com o Gaeco. Mas, para atender toda a demanda, é claro que a estrutura precisa ser melhorada. Hoje, o Ministério Público tem 30 procuradores e 169 promotores de Justiça para atender a todo o Mato Grosso.

MidiaNews – Como o senhor avalia o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Gaeco?

Paulo Prado – Hoje em dia, lidar com o crime não é fácil. Estamos numa situação em que você, para colocar algemas em alguém, tem que pedir por favor. Tudo o que o Ministério Público faz, o Gaeco faz, tenha certeza que é só dentro da Lei. Temos que lidar com criminosos inteligentes, com dinheiro, que não possuem um freio moral nem ético, e nós temos que atuar no limite da legalidade. O Gaeco atua no combate ao crime organizado. Combate à corrupção e temos aí cinco colegas em defesa do patrimônio público: os doutores Roberto Turin, Célio Fúrio, Gilberto Gomes, Mauro Zaque e a doutora Ana Cristina Barduco. Eles fazem um trabalho muito bom. Mas, o Ministério Público resolveu ouvir os colegas e a sociedade e uma situação foi levantada que é questão das drogas. Em maio do ano passado, o doutor Marcelo Ferra [procurador-geral de Justiça de Mato Grosso] designou o promotor de Justiça, doutor Marco Aurélio, para coordenar, dentro do Gaeco, o combate ao tráfico de drogas. Temos, então, um elo entre os colegas e a sociedade para desenvolver um trabalho de combate a este mal que atormenta as famílias.

MidiaNews – Como foi iniciado este trabalho?

Paulo Prado – Começamos a fazer um mapeamento, em conjunto com a Polícia Militar, a Polícia Civil, para levantarmos as bocas-de-fumo em funcionamento. Tem boca que passa de pai para filho. Foi do avô, passou para o filho e, agora, o neto é quem toma conta. O resultado foi o desencadeamento de várias operações, que resultaram na apreensão de pasta-base de cocaína, de maconha. É um trabalho de integração.

MidiaNews – O senhor pode citar algum exemplo?

Paulo Prado – Em outubro do ano passado, a “Operação Papo Reto” culminou com a apreensão de uma tonelada e meia de droga, que daria para abastecer cerca de 200 bocas-de-fumo. Foi a maior apreensão de droga realizada pelo Gaeco brasileiro [a operação foi na Serra de São Vicente]. Isso representou um prejuízo enorme para o traficante. Foi um duro golpe.

MidiaNews – De que maneira o tráfico vem sendo alimentado?

Paulo Prado – É outro ponto. A criminalidade estava muito alta e estava sendo alimentada financeiramente pelos grandes assaltos a bancos. É quem está alimentando isso é o Novo Cangaço [nova modalidade de assalto a bancos], que tem ligação com o PCC [Primeiro Comando da Capital, organização criminosa paulista] e está alimentando o tráfico de drogas e o tráfico de armas. É o financiamento da criminalidade com o dinheiro dos assaltos. São pessoas perigosíssimas. E este comando está atuando em todo o país. Dentro da organização tem a distribuição de tarefas. Um exemplo: eles precisam de algum especialista para explodir um cofre de alta resistência e não tem em Mato Grosso. Então, mandam buscar onde tem. Eles têm um grupo que vem planejar o assalto. Outros para dar o suporte, para fornecer armas, veículos, para conseguir o explosivo.

MidiaNews – Como foi o enfrentamento com estas quadrilhas do Novo Cangaço, que vem aterrorizando as cidades?

Paulo Prado – No ano passado, fizemos uma investigação durante dois meses. O resultado foi a Operação Novo Cangaço, em setembro. Policiais do Gaeco prenderam oito integrantes de uma quadrilha. No total, 11 foram denunciados pela Justiça, dos quais três encontram-se foragidos. Ao lado do enfrentamento às drogas, o enfrentamento ao Novo Cangaço é prioridade nacional dos Gaecos. Existe um trabalho de cooperação. Durante encontros do GNCOC [Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas], que reúne todos os Gaecos, cada Estado coloca suas preocupações e problemas e o Novo Cangaço foi apontado como um problema que está atormentando vários estados, pois esta modalidade tem ramificações nacionais.

MidiaNews – Uma prática que atormenta a sociedade é a “saidinha de banco”. Como tem agido o Gaeco neste caso?

Paulo Prado – A saidinha de banco estava atormentando a população. Todos nós temos amigos nas diversas camadas sociais. As pessoas vinham aqui e diziam: doutor, eu não agüento mais, minha mãe, de 80 anos, foi receber a pensão do papai e levaram todo o dinheiro. Vinha jovem, adulto, idoso. A população estava com sentimento de impunidade. Até que alguém trouxe uma informação. Com o envolvimento dos colegas, começamos a trabalhar essa informação e vimos que era quente. Foram 90 dias investigando e o resultado foi a identificação de 44 integrantes das quadrilhas que estavam agindo e que estavam divididos em cinco grupos. Eram criminosos que tinham na ficha roubo, latrocínio, assassinato. A pedido do Gaeco, a Justiça decretou a prisão destas pessoas, o que ocorreu em dezembro passado, durante a Operação Sétimo Mandamento. Depois, ele foram soltos por decisão do desembargador [Pedro Sakamoto, que concedeu habeas corpus visto que a juíza Suzana Guimarães Ribeiro de Araújo se declarou incompetente para julgar o caso], 21 foram recapturados [após novo pedido de prisão do MP] e os demais ainda se encontram foragidos. Se você fizer um levantamento, antes desta operação, a média era de cinco a seis saidinhas por dia. Hoje, praticamente não se tem notícia destes casos.

MidiaNews – Em dezembro, o Ministério Público entregou em Cáceres ao vice-presidente da República, Michel Temer, um documento com várias reivindicações. Já houve alguma resposta?

Paulo Prado – No documento que entregamos dissemos ao vice-presidente que o Estado tem uma necessidade brutal de ter uma base área, por ser uma região de fronteira com cerca de 1.000 quilômetros. O Estado precisa ainda de um presídio federal na cidade, de radares para detectar os aviões que voam baixo, do aumento do efetivo de agentes federais, e isso o Ministério da Justiça já atendeu com a abertura de concurso público. Estamos monitorando essas demandas, por meio do Conselho Nacional dos Ministérios Públicos, do GNCOC, através dos colegiados dos Procuradores de Justiça. Já conversei com os senadores de Mato Grosso, Blairo Maggi, Pedro Taques e Jayme Campos, a quem entreguei documentos e pedi apoio. Também já estive no Senado e conversei com o presidente da Comissão de Segurança, Fernando Collor de Mello, e devo conversar, nos próximos dias, com o novo coordenador da bancada federal, o deputado Homero Pereira. Estamos acompanhando de perto. Precisamos de recursos pesados para o combate ao tráfico de droga e contrabando de armas. Acho que o Governo Federal tem uma dívida conosco.

MidiaNews – Qual a melhor maneira de tratar o viciado, principalmente o usuário de crack?

Paulo Prado – Sou favorável à internação compulsória. Sei que posso sofrer críticas, mas, se não mudarmos a legislação, não conseguiremos avançar. O usuário é um doente e, por isso, deve ser tratado. Se ele não quiser se tratar, terá que ser recolhido a força. Sabe por que sou favorável a internação compulsória? Quem conhece o assunto e conhece os efeitos do crack, sabe que a droga acaba com a vida dele, com a vida da mãe, do pai, dos irmãos. Quando o dependente for encaminhado até o juiz de direito, junto com o policial, com o defensor-público, o promotor de Justiça, o juiz vai perguntar: Você é traficante ou usuário? O policial diz: doutor, ele foi preso com duas cabecinhas. Ele confessa ser usuário. Aí, o juiz pergunta: Você quer se tratar? Se não quiser, então você vai para a prisão. Porque a sociedade não pode continuar vivendo com pessoas que não têm consciência de seus atos. Se ele entrar em casa e o pai se negar a dar dinheiro, ninguém sabe a reação. Ou enfrentamos isso, ou amanhã, ou depois, não teremos uma sociedade sadia.

MidiaNews – Como o cidadão pode fazer denúncias ao Gaeco?

Paulo Prado – Muitos documentos chegam pelos Correios ou são entregues pessoalmente. Temos também a Ouvidoria do Ministério Público, que coloca à disposição do cidadão o número 127. A identidade será preservada. Quem preferir pode procurar pessoalmente qualquer um dos promotores, aqui do Gaeco. Agora, tem que entender que nós atuamos no combate ao crime organizado. Tem coisa que chega que não é de nossa competência, mas aí nós encaminhamos.

MidiaNews – Circula nos bastidores que o nome do senhor está cotado para disputar, novamente, o cargo de procurador-geral de Justiça de Mato Grosso. Procede?

Paulo Prado – A conversa eu sei que existe. Vários colegas, vários amigos têm conversado comigo. Mas acho que, de minha parte, seria uma indelicadeza com o doutor Marcelo Ferra [atual procurador-geral de Justiça]. Ele ainda tem um ano de mandato. Com sinceridade, ainda não pensei nisso. Fui duas vezes procurador-geral de Justiça, de 2005 a 2009. Tem que viajar, percorrer todo o Estado, atender as pessoas, conversar com instituições, segmentos, com a comunidade. Tenho que avaliar com calma, conversar com minha família e o meu médico [preocupação com a hipertensão e o diabetes]. Até porque eu sei que tem vários colegas interessados. Ainda é muito cedo, o processo é só em novembro.

Fonte: Mìdia News

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