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maio/2012

Salário para quem tem curso superior encolhe

O mercado de trabalho tem castigado os profissionais mais qualificados, acentuando um movimento que vem desde meados da década passada. Em 2011, enquanto o rendimento médio real dos trabalhadores da construção civil aumentou 5% e o dos trabalhadores domésticos cresceu 5,6%, quem possui diploma de curso superior viu seu rendimento real ficar parado, ou quase: pelos dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ele encolheu 0,1%.

Um descompasso entre oferta e demanda por mão de obra qualificada explica o porquê de os salários do trabalhador com ensino superior completo praticamente não terem crescido em 2011 e também nos últimos oito anos. O que acontece, segundo especialistas consultados pelo Valor, é que desde a década de 90 o ensino superior avançou com grande força em áreas em que a demanda não era capaz de absorver tantos profissionais se formando, especialmente nas ciências humanas.

A pressão salarial por mão de obra qualificada está concentrada em setores específicos da economia, como o de petróleo no Rio e o metalúrgico em São Paulo. A valorização desses trabalhadores é dissolvida por outros grupos, como de advogados e administradores, cuja oferta explodiu nos últimos anos sem que a demanda acompanhasse esse movimento, resultando em rendimento estagnado. No Rio, o rendimento médio das pessoas com ensino superior cresceu 5% em 2011, mas recuou 3% em São Paulo e 4,1% em Porto Alegre.

A perda de remuneração para os mais qualificados começou há mais tempo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o rendimento médio do pessoal ocupado com ensino superior completo cresceu apenas 0,3% entre 2003 e 2011, de R$ 3.839,93 para R$ 3.850,52. Na outra ponta, aqueles que têm no máximo oito anos de estudo (o que equivalia ao ensino fundamental) viram seu rendimento médio real crescer 30,6% na mesma comparação, de R$ 654,49 a R$ 854,83. Para aqueles com oito a dez anos de estudo (ensino médio), a valorização foi de 18,6%, enquanto quem tinha 11 ou mais anos de estudo em 2011, não necessariamente tendo concluído um curso superior, viu o salário subir apenas 3,2%.

“A demanda pelo trabalhador qualificado cresce em ritmo menor que a oferta. Isso faz com que o salário não cresça. Hoje, quando um empresário fala que falta mão de obra qualificada, ele não está se referindo a um universitário, necessariamente. Ele está se referindo a um trabalhador que tenha ensino secundário com alguma especificação”, diz José Márcio Camargo, professor da PUC-RJ e economista da Opus Investimentos.

“O Brasil passa por um processo de elevação da escolaridade média generalizada. Entretanto, a quantidade de pessoas que chegam ao mercado de trabalho com pelo menos o ensino médio completo se descolou da demanda do mercado por esse trabalhador, que cresceu menos”, explica Clemente Ganz Lúcio diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). “As empresas precisam de pessoal com formação técnica, da área de engenharia ou correlatas. Esse profissional falta no mercado de trabalho”, completa.

Por outro lado, as políticas de distribuição de renda e a valorização do salário mínimo, que se acentuaram desde o primeiro governo Lula, contribuíram para que o rendimento real de quem recebe menos – e, normalmente, tem menos escolaridade – crescesse tanto. Entre 2003, quando o salário mínimo valia R$ 240, e 2011, quando ele valia R$ 545, houve uma valorização de 63,6% do salário mínimo real, de acordo com cálculos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – índice que ajuda a explicar o ganho real de renda de 30,6% registrado pelo IBGE entre quem tem, no máximo, o ensino fundamental completo.

O avanço do setor de serviços, que configura um movimento típico de economias em desenvolvimento, ajuda a explicar porque os salários na base da pirâmide educacional crescem a um ritmo muito maior. O setor exige da sua mão de obra menos qualificação que a indústria, por exemplo. Como serviços tem ganhado espaço na economia brasileira, enquanto a indústria perde, é natural que o desemprego no setor diminua mais rapidamente e, os salários, valorizem-se.

“O emprego que cresce no Brasil é aquele que paga até dois salários mínimos. Isso é um sinal de que a nossa demanda está concentrada em trabalhadores menos qualificados”, explica Camargo.

Para Naercio Aquino Menezes, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, a expansão da renda e do nível educacional das classes mais pobres impulsionou o consumo de serviços, o que cria mais demanda de mão de obra para o setor e, consequentemente, puxa a renda do trabalhador e diminui o desemprego. Com maior poder de compra, há uma tendência de que o consumo de serviços aumente mais uma vez, reiniciando esse ciclo virtuoso.

Fonte: Valor Econômico

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