14

set/2012

A farsa do governo federal com a segurança pública

Por *Reni Rocha dos Santos

Reni Rocha dos Santos | Foto: Fabiano Viana

O Governo Federal autorizou através da Portaria 2.019, de 10 de setembro, assinada pelo Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, o emprego da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) no Distrito Federal (DF). Mediante solicitação do governador Agnelo Queiroz, foram enviados cerca de 100 policiais militares de outros estados da Federação com o objetivo principal de fiscalizar as 39 saídas do DF para as cidades do entorno, visando combater ilícitos penais e o tráfico de drogas.

A medida, porém, merece ser observada sobre os seguintes aspectos: por que apenas a solução paliativa de enviar policiais de outros estados, qualificados e necessários nas suas unidades de origem, para um reforço temporário? E, por qual motivo não se investe no policiamento ostensivo das vias de acesso através da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e dos grupos de policiamentos rodoviários estaduais das Polícias Militares dos Estados de Minas Gerais, Goiás e DF, respectivamente? Por que os pontos de bloqueio estão sendo realizados em rodovias federais e não nas rodovias distritais que ligam essas rodovias aos centros urbanos? Têm-se diversas discussões jurídicas acerca da existência da FNSP, mas o que preocupa são situações factuais: como o policial deverá exercer seu trabalho numa região desconhecida, onde os procedimentos de abordagem e a preocupação com a segurança dos usuários são diferentes daqueles empregados em rondas ostensivas urbanas? O policiamento rodoviário difere em muito do policiamento urbano, desse modo, quando as abordagens resultarem em situações de infrações e crimes de trânsito, qual será o procedimento da FNSP, uma que vez que, constitucionalmente, é a PRF que têm competência para autuar em rodovias federais? Sendo eficaz ou não essas blitzes em rodovias pela FNSP, até quando ela será empregada?

Com isso, denota-se que as medidas adotadas por nossos governantes são meramente paliativas, pois, verifica-se que, realizada a etapa presencial com a FNSP, novamente, dão-se as costas para a origem do problema. Atente-se que fatos semelhantes se reproduzem diariamente em diversos pontos do território nacional, portanto, o binômio Segurança Pública nunca é tratado de forma responsável e integral, pois, sempre fica evidenciado que o nascedouro do problema nunca é atacado pelos governos, ao contrário, o que se faz é deixá-lo se transformar em fortalezas da criminalidade e da insegurança.

O outro tema relevante a ser observado são as atribuições e competências legais de cada instituição policial. Neste aspecto, no âmbito das estradas e rodovias federais, não se permite olvidar do poder de polícia inerente à atividade da PRF e da qualidade dos serviços realizados nas rodovias do país.

Como guardiã da Segurança Pública em sua área de atuação, a PRF desempenha atividades como a preservação da ordem, a incolumidade das pessoas, o patrimônio da União e o de terceiros; o combate ao tráfico e a exploração sexual de crianças e adolescentes; o combate aos crimes contra a vida, os costumes, o patrimônio, a ecologia, o meio ambiente, furtos e roubos de veículos e bens, tráfico de entorpecentes e drogas afins, o contrabando, o descaminho e os demais crimes previstos em leis. Além de também exercer, exclusivamente, o poder de polícia de trânsito da União. A PRF faz isso com cerca de 1.200 policiais trabalhando por dia em escala de 24×72 horas nos 388 postos de fiscalização distribuídos ao longo de 70.000 quilômetros de rodovias federais. Para os 950 quilômetros de malha viária federal que corta o DF tem-se em média 20 policiais por dia, divididos nos 5 postos de fiscalização, inclusos os postos do entorno (Cristalina, Formosa e Alvorada do Norte/GO).

Mas o trabalho da PRF está sendo satisfatório aos olhos da sociedade? Recente pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica (Ipea) mostrou que a sociedade confia mais nas polícias da União (Polícia Federal e Rodoviária Federal). Na região centro-oeste, a PRF é a que possui o melhor índice de aprovação, 74,8%, quando o tema é competência e eficiência no trabalho realizado. Claro que este índice deveria ser muito maior para um serviço público. Esta é a opinião dos policiais rodoviários federais que atuam no DF e com certeza dos demais pelo resto do país.

A grande maioria destes policiais também concordam que as diretrizes operacionais deveriam ser mais bem implementadas, porém, muita coisa esbarra na falta de infraestrutura e recursos humanos, matérias e financeiros.

Mesmo diante de todas as dificuldades enfrentadas, os policiais rodoviários federais no DF estão cientes e são cumpridores de seu papel perante o combate à criminalidade e o faz em paralelo às demais atribuições legais. Ao analisar a produtividade da PRF apenas no DF, os números mostram que no ano de 2011, a PRF apreendeu no DF cerca de 19 kg de cocaína e 6 kg de maconha, 108 pessoas procuradas pela justiça foram detidas e 498 foram presas em flagrante delito. Também foram apreendidas 21 armas de fogo e 314 munições. Somente para ilustrar o trabalho de combate ao tráfico de drogas em âmbito nacional, nesse mesmo ano a PRF apreendeu 6 toneladas de cocaína e 60 de maconha, além de outras drogas e afins. Costumeiramente, representando apenas 0,43% do efetivo de todas as polícias do Brasil, a PRF é a polícia que mais apreende drogas no país.

É claro que os profissionais de segurança pública e a sociedade concordam que o Governo Federal deve ou deveria investir mais e sempre em segurança pública, especialmente através do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), que concentra as ações nacionais de combate à violência e à criminalidade. Porém, poucos sabem que o SUSP não é tão único assim: as polícias federais (PF, PRF e PFF) não fazem parte das decisões e nem dos projetos elaborados por aquela entidade. Isso quer dizer que temos ações coordenadas pela União (unificação de polícias, uniformidade de formação e de procedimentos, guardas municipais, etc.) para os outros Entes Federativos, mas não um projeto coeso para as polícias que pertencem ao Ministério da Justiça.

Como o modal de transporte adotado pelo Brasil é o rodoviário, também segundo o Ipea, 70% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro circula sobre rodas. Com o recente crescimento econômico, cerca de 8 bilhões de reais são transportados por dia pelas rodovias federais. Nem isso, fez ou faz com que os governantes enxerguem a urgente necessidade de se investir em policiamento rodoviário, nas suas diversas formas.

Após a instalação do SIVAM, sistema que monitora o espaço aéreo nacional, o crime organizado foi obrigado a mudar de estratégia para transportar seus ilícitos. Então, praticamente, toda a fonte de renda e de insumos que fomentam as práticas criminosas veio para as rodovias, que, historicamente, são mal policiadas. Verifica-se facilmente que o descaso com a segurança pública nas estradas e rodovias chega a ser gritante, alguns Estados nem contam com batalhões rodoviários, derivados das Polícias Militares, para a fiscalização de trechos específicos. Se existisse um policiamento mais eficiente e ostensivo o resultado seria mais abrangente e positivo. Se ao menos, existisse sistemas de inteligência integrados entre as forças de segurança pública, o que tornaria mais fácil e eficiente o controle efetivo também das vias urbanas e rurais, talvez o governo não apelasse para o controle midiático ou estéril de nossas fronteiras e divisas.

Portanto, enquanto a sociedade e a mídia não conhecer os verdadeiros culpados pela insegurança e aumento crescente da criminalidade em nosso país, tanto a PRF quanto as demais polícias, sempre trabalhando e cada vez mais aumentando seus números de apreensões, continuarão fazendo o de sempre, ou seja, enxugando gelo.

*Reni Rocha dos Santos é presidente do Sindicato dos Policiais Rodoviários Federais no Distrito Federal

COMPARTILHAR