Má gestão e fraudes nas aplicações dos recursos ameaçam o futuro de cerca de 7,5 milhões de funcionários ativos, inativos e pensionistas vinculados a pouco mais de 2 mil fundos de pensão de Estados e municípios. Ações policiais – como a Operação Miqueias, desencadeada pela Polícia Federal em setembro e com atuação concentrada em 15 municípios – revelam parte do problema, que pode resultar em perdas bilionárias para esses fundos, o que traria sérios riscos à sua sustentação financeira e à sua capacidade de pagar os benefícios esperados por seus participantes.
Os fundos de pensão dos Estados e municípios foram criados para garantir a aposentadoria dos funcionários por meio do regime de contribuição definida, em substituição ao anterior, que assegurava aos servidores aposentadoria integral. Na área federal, o novo regime passou a vigorar em fevereiro de 2013, com o início das operações do Fundo de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp).
O objetivo da criação desses fundos, que compõem o Regime Próprio de Previdência dos Servidores (RPPS) – o dos demais trabalhadores é o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) -, é assegurar que, ao longo do tempo, ele alcance o equilíbrio atuarial, eliminando a necessidade de aporte de recursos dos Tesouros federal, estaduais e municipais. Isso levará muito tempo. As projeções indicam que, no caso do regime federal, esse equilíbrio será alcançado em prazo muito longo. As estimativas mais otimistas apontam que o déficit do RPPS federal só começará a diminuir dentro de 15 anos. Nas contas do governo, o déficit estará zerado entre 2045 e 2050. Projeções menos otimistas preveem o fim do déficit em 2100.
Boas práticas de gestão, aplicações prudentes, observância das normas regulamentadoras desses fundos, entre outros procedimentos adequados de seus administradores, poderiam, se não reduzir esse prazo, pelo menos contribuir para que ele não seja estendido e também assegurar o pagamento dos benefícios esperados.
Auditorias do Ministério da Previdência e operações policiais têm revelado, no entanto, que esses fundos, cujo patrimônio alcança cerca de R$ 180 bilhões, estão sujeitos a má gestão e fraudes que sangram seus recursos. Recente levantamento do Ministério da Previdência constatou que práticas que contrariam as regras do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central e a ação de esquemas criminosos provocaram perdas de R$ 528 milhões em aplicações feitas entre 2009 e 2013.
Entre os atos ilícitos identificados nessas ações estão apropriação indébita, pagamento indevido de benefícios, falsidade ideológica, utilização indevida de recursos e improbidade administrativa.
Operações policiais têm identificado a existência de organizações criminosas especializadas em desviar – com a conivência dos gestores – as aplicações para fundos sem qualificações técnicas para recebê-las. Quadrilheiros e servidores são beneficiados por esses esquemas.
Há dias o jornal O Globo noticiou que dinheiro de servidores estaduais e municipais foi aplicado em fundos de investimento privados compostos por títulos sem valor real de mercado, pois foram emitidos por empresas sem rentabilidade, falidas ou em processo de recuperação judicial ou de liquidação.
De acordo com o jornal, as fraudes envolveram recursos de R$ 2 bilhões pertencentes a 117 fundos de pensão. Na maioria dos casos, as aplicações foram gerenciadas por empresas apontadas como responsáveis por lavagem de dinheiro para políticos envolvidos no caso do mensalão. Num dos casos, uma aplicação de R$ 335 milhões perdeu R$ 51 milhões de seu valor em apenas dois meses.
Há também casos de favorecimento, com a concentração das aplicações numa determinada empresa – o que é proibido pelas normas do RPPS – ou em títulos de empresas à beira da insolvência.
A grande disponibilidade de recursos dos fundos de pensão dos servidores alimenta a cobiça de criminosos e exige, como resposta, uma fiscalização mais intensa, tanto do governo como do Tribunal de Contas da União.
Fonte: O Estado de São Paulo