Balanço dos dois anos de exigência do assento para crianças em veículos domésticos mostra que a norma reduziu o número de vítimas infantis em acidentes, contudo, ainda precisa ser aperfeiçoada. Instalação obrigatória em vans é um exemplo.
A avaliação dos dois anos da entrada em vigor da chamada Lei da Cadeirinha traz duas constatações conflitantes: ao passo em que ela contribuiu decisivamente para reduzir o número de mortes de crianças em acidentes de trânsito, especialistas cobram modificações para suprir brechas claras na legislação. Dados do Ministério da Saúde revelaram que o uso obrigatório do dipositivo levou à redução em 23% no número de mortes de crianças com até 10 anos de idade, no primeiro ano de aplicação da Resolução nº 277 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Por outro lado, a exigência que é feita aos veículos domésticos não se estende, por exemplo, aos transportes escolares — uma falha, segundo especialistas.
Pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela que a aplicação da Lei da Cadeirinha, até aqui, deve ser considerada positiva. O número de óbitos passou de 296, entre 2009 e 2010, para 227, entre 2010 e 2011. De setembro de 2005 a agosto de 2011, foram registrados 1.556 óbitos de crianças até 10 anos, resultando em uma média anual de 267,9 crianças mortas no trânsito enquanto ocupavam veículos. De acordo com o Ministério da Saúde, é a primeira vez em seis anos que existe queda no número de mortes. A resolução entrou em vigor em 1º de setembro de 2010.
Para o coordenador do projeto Criança e Segurança da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), porém, a expectativa era de que o uso das cadeirinhas fosse mais intenso. “Houve uma grande procura logo que a portaria foi apresentada, tanto que faltaram cadeirinhas no mercado. Comprava-se muito mais pelo medo da multa do que pela conscientização”, explica. Para ele, a falta de um procedimento padrão de fiscalização fez com que houvesse um regresso na utilização do dispositivo de segurança. “A fiscalização deveria ser mais simplificada. A resolução tem muitos dados vinculados à idade e peso e fica difícil para um agente de trânsito avaliar isso.”
O sociólogo e especialista em segurança no trânsito Eduardo Biavati critica o fato de a norma não incluir a obrigatoriedade do uso do equipamento em vans escolares. “São brechas na legislação que só dificultam o entendimento. É estranho convencer a criança a usar a cadeirinha no carro da mãe se ela não tem que usar no transporte escolar. É uma situação contraditória que dificulta a educação das crianças para uma conduta de segurança”, avalia. Além das vans escolares, não estão incluídos na resolução os veículos de transporte coletivo, os táxis e os carros alugados.
No entanto, Biavati acredita que a redução no número de mortes ao longo do primeiro ano de aplicação da regra está relacionada ao envolvimento dos pais. “Mesmo diante de uma fiscalização difícil de ser feita, os dados indicam que houve adesão espontânea. A ameaça da fiscalização contribuiu inicialmente, mas não foi determinante para essa redução. Acho que de lá para cá, quem sustenta esse resultado são os próprios pais.”
Para Isabela, de 4 anos, e Mariana, de 1 ano e dois meses, o uso da cadeirinha faz parte do dia a dia. “Elas sempre usaram, então nem pensam em sair sem”, explica a mãe, Cynthia Berberian, de 39 anos, que fazia uso do equipamento antes da resolução. “Li que nos Estados Unidos era obrigatório usar a cadeirinha, então comprei antes de a Isabela nascer.” A funcionária pública acredita que o dispositivo é uma garantia de segurança e um conforto para as filhas durante os passeios de carro, mas critica o fato de os veículos populares não terem espaço suficiente para o bebê conforto e a cadeirinha. “Troquei de carro recentemente e tive que levar a cadeirinha para o test drive, para ver se não ficava apertada no banco traseiro.”
Preguiça e multas
No entanto, segundo informações do Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF), a quantidade de pais que conduzem os filhos sem o equipamento de segurança ainda é alta. De janeiro a junho de 2012, foram registradas 522 infrações relativas ao transporte irregular de crianças. Em todo o ano de 2011, foram 606 multas.
“Ainda flagramos muitas irregularidades”, afirma o diretor de Policiamento e Fiscalização de Trânsito do Detran, Nelson Leite. De acordo com ele, a maioria dos pais notificados alega preguiça de colocar a criança na cadeirinha ou considera desnecessário o equipamento por estar fazendo um trajeto curto. “Hoje não cabe mais a justificativa de não encontrar a cadeirinha no mercado. Quem não a utiliza está deliberadamente desrespeitando, não só a regra de trânsito, mas também a saúde do filho.”
“É estranho convencer a criança a usar a cadeirinha no carro da mãe se ela não tem que usar no transporte escolar. É uma situação contraditória que dificulta a educação das crianças para uma conduta de segurança” – Eduardo Biavati, sociólogo e especialista em segurança no trânsito.
Fonte: Correio Braziliense