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ago/2016

“O policial exerce a profissão mais perigosa no Brasil”, afirma Nilson Giraldi

O especialista em segurança pública Nilson Giraldi (Cel PMESP) não possui dúvidas na hora de dizer que os policiais estão submetidos a um grau tão alto pressões que exercem atualmente a profissão mais perigosa no Brasil e a segunda no Mundo.

Em entrevista à TV Câmara Bauru, o Coronel da PM, que é especialista nas questões de técnicas e abordagens, falou um pouco sobre o universo emocional dos policiais. Homens e mulheres que atuam em defesa da sociedade e são submetidos a todos os tipos de pressões, sem chance de errar, principalmente em um confronto armado.

Confira abaixo os principais trechos e o vídeo com a íntegra da entrevista.

Apresentador: No estudo do senhor, o senhor aponta entre inúmeros elementos, mas esse aqui eu achei fundamental, que está falando de relações humanas, de compreender o outro. Estou tentando convidar as pessoas a entender o universo emocional, psíquico, da vida do policial obviamente. O estudo do senhor aponta que apenas 5% das nossas reações são feitas de forma racional, a razão, a racionalidade, portanto, por repetição. Na hora do conflito, 95% é que são acionados.

Cel.Giraldi: É, realmente, só 5% do nosso cérebro é consciente. Nós temos acesso a essa parte. Então eu domino esses cinco por cento, estou dominando, estou falando… e 95% é inconsciente, nós não temos acesso a essa parte. E é nela que está o perigo. Por exemplo, nesse instante meu coração está batendo, seu sangue, nosso sangue está correndo, nós estamos aqui calmos. Mas, vem uma colocação bem simples. A química do nosso corpo é que conduz nossas emoções, sem exceção. É a química do corpo. E essa química do corpo não é produzida pela parte consciente, mas pela parte inconsciente. Adrenalina, eu não provoco a adrenalina na hora que eu quero. É um hormônio chamado endorfina, que essa parte inconsciente produz, quando nós praticamos exercícios aeróbicos ou aeróbios de longa duração, produz a endorfina, que dá a satisfação, dá a alegria. O contato com animais de estimação, com a natureza, por exemplo, essa parte inconsciente produz um hormônio chamado serotonina, e eu não produzo a serotonina na hora que eu quero. É a hora desse contato, é automático. E aí vem que, na rua…

Apresentador: O policial tem uma bomba de adrenalina.

Cel. Giraldi: é direto, é direto. O policial na rua, eu não vou falar que ele vive tenso, mas quase. Só quem está dentro daquela farda, daquele colete, com esse calor todo, podendo levar um tiro de qualquer lado, é chamado para um universo de coisas, pois o policial é chamado desde realizar um parto até acolher uma criança que foi estuprada e estão querendo linchar o estuprador e ele tem que chegar lá e proteger o estuprador. É um universo muito grande. É extremamente complexo, tanto que a Organização Mundial da Saúde afirma que a função policial é a segunda mais perigosa do mundo. E no Brasil é a mais perigosa. Esses policiais militares que nós vemos na rua estão exercendo a missão, a função a profissão mais perigosa que existe no Brasil e uma pessoa nessa situação está submetida a pressões de todos os lados e o que falar durante um confronto armado? Aí é que complica. A emoção dele naquele instante será provocada pela parte inconsciente do cérebro. Se ele não souber administrar, se ele não aprendeu, eu uso a palavra administrar, porque é impossível um pessoa ficar calma, como nós estamos, diante da morte. Não há chance!

Jornalista: Temos que ensiná-lo, treiná-lo prepará-lo para administrar essas composições emocionais.

Cel. Giraldi: Administrar, porque o policial na rua quando entra num confronto armado, como nós tivemos recentemente, ele nunca tem a iniciativa. É é o agressor que tem a iniciativa, ele reage. Ele reage numa situação que ele não está aguardando, o agressor já está preparado para ter iniciativa. Aí vem que naquele instante, diante da morte, muitas coisas ocorre com o policial, qualquer policial, desde alterações físicas e psíquicas, desde o medo até o pânico. Medo dá pra administrar mas o pânico ninguém consegue administrar o pânico. Daí ele tem diante da morte que está presente, por exemplo, a pupila dilata, a tez fica fria, gelada, a barriga encolhe, a perna treme, a capacidade de raciocínio vai para o espaço, dá uma coisa chamada “túnel de visão”, em que olha e não vê, o som chega e não ouve, é horrível! Depois, as autoridades vão analisar a atuação do policial militar ou do policial, no ambiente com ar condicionado, quadro a quadro, “olha, aqui ele fez isso…” Mas e na hora? Antigamente ele só era treinado para matar e era ele que morria. Matar qualquer um sabe. Hoje ele é treinado para preservar a vidas, as duas principais, a dele e da pessoa inocente e também a do agressor. Quando o agressor levanta os braços, ele está dizendo “não atire em mim”, o policial não atira. Quando o agressor dispara contra terceiros, ou contra o policial, ou contra uma pessoa inocente, ele está dizendo “atire em mim”, é legítima defesa. O policial tem obrigação de defender essa pessoa. É a lei que determina. Portanto, o policial não dispara contra o agressor porque quer, é o agressor que obriga ele a disparar contra o agressor. E aqui entra uma coisa interessante: o policial deve treinar e disparar para matar ou deve treinar e disparar para não matar? Essa pergunta a gente faz para juízes, promotores, pessoas comuns. Qual é a resposta? O policial treina e dispara para matar ou treina e dispara para não matar? Quem treina e dispara para matar são as forças armadas. Ela tem inimigo, tem que matar. O policial não tem inimigo. A resposta correta é: o policial treina e dispara para fazer cessar uma agressão de morte do agressor contra sua vítima, ele quer matar a vítima. Então o policial tem que disparar para fazer cessar aquela agressão. Ele não dispara para matar mesmo porque num confronto armado não dá para escolher ponto de acerto, ele dispara na direção, dois tiro de cada vez “pow, pow”. Muitas vezes o disparo nem acerta o agressor, ele pára. Parou a agressão, acabou o tiro.

*Nilson Giraldi – Cel PMESP.  Professor e Educador.  Especialista em Segurança Pública. Faz parte do Corpo Docente do Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores da PMESP.  Tem atuado como consultor, assessor e professor  do  Comitê Internacional da Cruz Vermelha; dos Direitos Humanos; Policiamento Comunitário; Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP); Polícias (nacionais e internacionais, incluindo a PMESP).

Fonte: TV Câmara Bauru

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