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maio/2013

Comissão defende tipo penal para assassinato de mulher por razões de gênero

A tipificação do feminicídio na legislação penal brasileira foi defendida na Subcomissão Permanente em Defesa da Mulher, nesta quarta-feira (8), durante audiência para debater o tema. Já previsto como crime específico em países da América Latina, como o México e o Chile, o feminicídio é descrito como o assassinato intencional de mulheres por homens, em função de seu gênero, em meio a formas de dominação, exercício de poder e controle sobre suas vidas.

A juíza de Direito Adriana Mello, titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, no Rio de Janeiro, mencionou conceitos que associam a esses crimes uma motivação de “ódio, desprezo ou sensação de posse sobre as mulheres”. Segundo ela, esse é o tipo de violência que reflete relações desiguais de poder, como um espelho da “subordinação e a discriminação” em toda as formas de manifestação.

– É a culminação de um ciclo de violência que vai desde uma agressão verbal, emocional, sexual, psicológica, física, e até mesmo toda a política tolerada pelo Estado que, no extremo, resulta na morte de mulheres – afirmou.

A cidade mexicana de Juárez, na fronteira com os Estados Unidos, foi citada como símbolo do movimento pela tipificação do feminicídio. Depois de forte aumento do número de assassinatos de mulheres, que chegou a quase 300 em 2003, pressões de órgãos internacionais contribuíram para a criação do tipo penal no país, à parte do homicídio. Outra mudança foi um tratamento menos tolerante do aparato estatal em relação aos acusados. Nem sempre investigados, os crimes quase sempre envolviam extrema violência, com estupro seguido de morte, esquartejamento e até destruição dos corpos com cal.

Para a juíza, as propostas para a tipificação do crime no Brasil nem inclui previsão de aumento da pena, na comparação com o homicídio. De acordo com ela, o objetivo é essencialmente realçar a intolerância com esse tipo de crime e contribuir para a geração de estatísticas sobre sua ocorrência.

Estatísticas

Dados reunidos no Mapa da Violência 2012 indicam que os homicídios femininos, que haviam recuado no início da década de 1990, voltaram a subir, principalmente entre adolescentes. Pelas estatísticas, a cada cinco minutos, uma mulher é agredida no Brasil, sendo registrados 4,4 assassinatos de mulheres em cada grupo de 100 mil, o que coloca o Brasil no 7º lugar entre os 87 países com maior número de homicídios femininos.

Adriana Mello destacou estimativa de que 70% desses homicídios estão associadas à condição de gênero e são cometidos por homens próximos, como companheiros ou ex-companheiros. Porém, ela salientou que as estatísticas são precárias. Por isso, defendeu a criação de banco de dados referentes a homicídios de mulheres em razão do gênero.

Cultura

A secretária-executiva da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Lourdes Bandeira, classificou o feminicídio de “expressão perversa” de um tipo de dominação masculina ainda muito enraizada na cultura brasileira. Conforme assinalou, os impactos dessa extrema violência ainda são silenciados e, muitas vezes, deturpados pelo discurso “misógino e patriarcal” dominante.

– É uma barbárie praticada sem distinção de lugar, de cultura, de raça, ou de classe – assinalou Lourdes Bandeira.

O papel do Estado no contexto da violência de gênero foi salientado pela expositora. Segundo ela, o feminicídio prospera porque as instituições estatais não garantem a segurança das mulheres ou pouco agem para mudar o ambiente no qual suas vidas ficam expostas, tanto na vida doméstica como nas comunidades. Muitas vezes, as autoridades também não cumprem suas obrigações, como apurar e julgar.

– Daí a necessidade de compreensão sobre esse tipo de violência em todos os espaços jurídicos e criminais, para assegurar a diminuição da impunidade e a imprescritibilidade dos crimes – defendeu Lourdes Bandeira.

Rede de proteção

O debate foi proposto pela senadora Ângela Portela (PT-RR), relatora da subcomissão, que é vinculada à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). Além de criticar a impunidade, Ângela Portela cobrou recursos para ampliar e estruturar a rede de serviços destinada a enfrentar os crimes de gênero e dar proteção às vítimas. Observou que, em todo o país, existem apenas 475 delegacias especializadas, 147 juizados também especializados ou qualificados para julgar esses casos. Para acolher as vítimas conta-se com somente 68 casas abrigos.

O debate foi acompanhado pela presidente da CDH, senadora Ana Rita (PT-ES), também relatora da Comissão Parlamentar Mista da Violência Contra a Mulher. A seu ver, o tipo penal do homicídio deve ser previsto no Código Penal. A sugestão deverá constar das recomendações da comissão mista, cujo relatório final será entregue até junho.

A coordenação da audiência foi compartilhada pela relatora Ângela Portela e, ainda, a presidente da subcomissão, senadora Lídice da Mata (PSB-BA). Também participou como expositora a presidente da Liga Roraimense de Combate ao Câncer, Magnólia de Souza Monteiro Rocha.

 

Fonte: Agência Senado

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