Por Plácido Fernandes Vieira
O alinhamento de intelectuais com a esquerda sempre se deu pela identificação com a defesa dos direitos humanos, da distribuição de renda, da igualdade social, da liberdade e da fraternidade. Do outro lado estava a direita. Intransigente. Atrelada com unhas e dentes ao capital, ao livre mercado, ao individualismo selvagem. Enfim, da exploração do homem pelo homem, do salve-se quem puder. A esquerda se regia pela ética, a justiça social. A direita, pelo vale-tudo desumano do lucro. Apesar de simplistas, e errôneos, os conceitos acima continuam em voga a dividir corações e mentes.
Quem, de bom coração, estaria ao lado dos desalmados capitalistas? A tese do bem (esquerda) contra o mal (direita) começou a ruir quando ficou claro que, uma vez no poder, socialistas e comunistas (Stalin, Fidel, Mao) acabavam se tornando tão tiranos quando ditadores de direita (Hitler, Mussolini, Pinochet). Intelectuais engajados na luta por um mundo mais justo, igual e fraterno, como Albert Camus e George Orwell, logo perceberam o golpe e o denunciaram. Tornaram-se ícones dos que combatiam qualquer forma de totalitarismo e foram escorraçados pelos colegas de esquerda.
No Brasil, a ascensão de Lula ao poder teve duplo efeito. O primeiro, inegável, positivo, foi o aprofundamento da distribuição de renda no país, iniciado pela dupla Itamar/FHC – via controle da inflação, Lei de Responsabilidade Fiscal e maior controle do Estado sobre as atividades financeiras. O outro, negativo, foi a guinada do PT à direita, com a adesão a práticas que antes condenava. Ao escândalo do mensalão, que poderia ter levado ao impeachment de Lula, seguiram-se todo tipo de denúncia de irregularidades perpetradas por petistas e aliados que passaram da condição de indefensáveis a amigos acima de qualquer suspeita. Como na declaração de Vaccarezza (PT) a Cabral (PMDB): “Nós somos teu”. O que é isso, deputado?
Este artigo, na verdade, era uma tentativa de lançar uma discussão sobre esquerda e direita. A velha dicotomia do bem versus o mal ruiu faz tempo. Mas continua em moda. No Brasil, na prática, houve uma “direitização” do PT. No discurso, porém, o partido e os neoconvertidos ao lulismo se apresentam como de esquerda. Gente que sempre foi de esquerda passou a ser raivosamente enquadrada como de direita pelos reacionários de antigamente. O pivô da discórdia é a liberdade de expressão. Quem tem opinião própria, defendem os petistas de ocasião, precisa ser submetido à mordaça. Há gente de bem que ainda não percebeu a gravidade da ameaça. Orwell e Camus alertaram faz tempo. Tomara que não descubram isso tarde demais.
Fonte: Correio Braziliense