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set/2012

‘Sindicatos têm de se envolver politicamente’, diz dirigente estadunidense

Filho de metalúrgico e funcionário da Ford nos anos 70, formou-se em Direito na Universidade de Detroit, Michigan, estado onde nasceu em 1946, berço da indústria automotiva dos EUA. Casado, pai de cinco filhos, foi eleito para presidir o UAW de 2010 a 2014.

Visto como o mais poderoso sindicato de metalúrgicos, o UAW (sigla para United Auto Workers), que representa 390 mil trabalhadores e 600 mil aposentados do setor automobilístico estadunidense, abre este mês uma filial no Brasil. Segue, assim, a mesma estratégia das montadoras que, diante da queda da clientela nos países-sede estão migrando para países em desenvolvimento.

Com a decadência do movimento sindical [lá nos Estados Unidos, segundo a repórter], o UAW tem como bandeira hoje criar o que seu presidente, Bob King, chama de movimento global de solidariedade entre os trabalhadores.

Em visita ao Brasil nesta semana, o sindicalista fez críticas à atuação de montadoras que tentam impedir a organização dos trabalhadores e defendeu a relação próxima entre centrais sindicais e governo.

“O único grupo organizado que de fato representa os interesses dos trabalhadores são os sindicatos e eles devem se envolver com o governo e, quando isso ocorre, há mais resultados positivos nas questões sociais.”

Ex-funcionário da Ford, formado em Direito, foi eleito em 2010 para gestão até 2014. Aos 65 anos, pretende revitalizar o movimento sindical nos EUA e no mundo todo. No Brasil, participou de encontro da CUT, reuniu-se com políticos em Brasília e visitou o ex-presidente Lula, que considera um “ídolo”. (Com O Estado de S. Paulo)

A seguir, trechos da entrevista, que vale a pena ler, pois é muito esclarecedora.

Por que o UAW vai ter um escritório no Brasil?

Faz parte da ofensiva de criar um movimento global de solidariedade entre os trabalhadores. Viemos para o Brasil pela mesma razão que as empresas transnacionais estão em todos os lugares, mesmo onde não têm produção. Nós, trabalhadores, precisamos ter essa presença também. Já temos escritórios na França, Índia e México. Abrimos no Brasil e, futuramente, na África do Sul e Alemanha.

Como será a estrutura aqui?

Buscamos um local em São Paulo, mas já designamos uma representante que tem como tarefa construir a proximidade de atuação entre entidades sindicais. Logo teremos mais gente.

Qual sua opinião sobre o movimento sindical brasileiro?

Tenho inveja. O Brasil é uma esperança para as pessoas ao redor do mundo, pois tem assistido a muitas mudanças. Há muito mais pessoas saindo da pobreza. O País está fazendo progresso. Os EUA estão no caminho inverso. A desigualdade está crescendo. O Brasil está fazendo todas as coisas certas e os EUA todas as coisas erradas.

O sr. acha saudável a relação próxima da CUT com o governo?

Eu vejo como muito boa. A CUT e os sindicatos são porta-vozes dos trabalhadores, sindicalizados ou não. O único grupo organizado que de fato representa os interesses dos trabalhadores são os sindicatos e eles devem se envolver com o governo. Quando isso ocorre, há mais resultados positivos nas questões sociais.

Mas como fica a credibilidade em situações, por exemplo, como a que vivemos agora, em que membros do PT, apoiado pela CUT, serão julgados por corrupção, no processo do Mensalão?

Eu acho que os sindicatos têm de se envolver politicamente. Apoio essa ação em qualquer lugar do mundo, de estar envolvido com todos os partidos políticos e candidatos que apoiam a justiça e as demandas dos trabalhadores. Eu não sei o envolvimento específico da CUT nesse contexto, mas os sindicatos, em qualquer lugar, devem ter regras rigorosas sobre corrupção, integridade, assim como os governos devem ter também.

O UAW está preocupado com a atuação da japonesa Nissan, que vai inaugurar fábrica no Rio de Janeiro. Por qual motivo?

Nos EUA, temos grande campanha em andamento para as companhias transnacionais: Toyota, Honda, Nissan, Volkswagen, Mercedes, BMW, Hyundai, Kia. Algumas empresas têm sido muito agressivas no que diz respeito à organização dos trabalhadores, dos seus direitos reconhecidos internacionalmente. Trabalhamos globalmente para evitar esse tipo de repressão. Na fábrica da Nissan, no Mississipi, os trabalhadores não têm representação sindical nem acordo de negociação coletiva, e grande parte é contratada como temporária, por agências.

A Nissan já atua no Brasil junto com a Renault, no Paraná. O sr.dentificou algum problema?
Minha visão é que a Nissan, globalmente, é uma boa corporação. Ela trabalha com os sindicatos em quase todos os países do mundo, mas não age assim nos EUA. Queremos alertar a todos os sindicatos sobre essa situação, para evitar que se repita.

Como vê a relação de outras montadoras, como GM e Ford, com os funcionários no Brasil?

Trabalhei na Ford, que tem uma rede global, por isso tive mais contato com os trabalhadores da empresa, principalmente em São Bernardo, e a relação com a empresa, pelo que sei, é muito positiva. Os dois lados entendem a necessidade de sucesso e trabalham juntos.

O UAW tem um slogan que pede “compre carros americanos”. É possível manter essa campanha e ao mesmo tempo lutar por causas internacionais?

Sim. Queremos construir sindicatos fortes em todos os países porque, dessa forma, os trabalhadores conseguem melhores salários, compram mais mercadorias e geram tributos que são revertidos em mais educação, em infraestrutura. Acreditamos que, agindo em conjunto, todos os trabalhadores serão beneficiados e não vão precisar lutar uns contra os outros.

A China paga baixos salários para os trabalhadores para vender produtos baratos…

Discordo. Essa é a nossa percepção da China, mas acabo de voltar de lá, onde estive com federações e sindicatos. Hoje, eles têm um claro objetivo de tirar as pessoas da pobreza, de formar uma classe média forte. Há um número maior de crianças com acesso à educação. Não é ainda o ideal, mas há progressos. Nos EUA, estamos fazendo o oposto. Estão cortando verbas para educação. Quando eu me formei, vinha de uma classe trabalhadora e pude estudar numa boa universidade. Foi uma luta, mas foi possível. Hoje, as crianças da classe média, da classe trabalhadora, não podem ir para a universidade sem que as famílias façam uma dívida de 50, 80, 100 mil dólares. Todo ano cai o porcentual de estudantes que são da classe trabalhadora. Nossa sociedade está indo para o caminho errado. Espero que possamos reconstruir o movimento sindical nos EUA para voltarmos ao caminho de uma sociedade melhor.

Os sindicatos também foram responsáveis pela recente crise das montadoras?

Se alguém diz que a culpa é dos sindicatos e não responsabiliza as empresas não é correto. E vice-versa. Talvez tenhamos focado nos temas internos, sem ter dado atenção ao aprofundamento da competição. Fui eleito justamente por ter discordado do nosso passado de falta de organização da produção. O sindicato entende que houve um período em que nos tornamos complacentes com nossos contratos e perdemos o foco. Agora estamos muito pró-ativos em nossa participação global, em construir alianças para o desenvolvimento dos EUA.

DIAP

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