Por: Antônio Augusto de Queiroz
O Brasil, desde a redemocratização, já avançou muito em termos de transparência, de controle e de combate à corrupção. Mas ainda está longe do pleno controle social e do fim da impunidade.
Nessa perspectiva, é possível identificar, por governo, as principais iniciativas com o objetivo de ampliar a visitação pública às decisões governamentais e propiciar condições para a fiscalização e o controle.
No governo Sarney, podemos mencionar o sistema de administração financeira (Siafi), com o registro de todos os gastos governamentais, e o fim da conta movimento do Banco do Central, considerada uma fábrica de moeda.
No governo FHC, lembramos a criação da Controladoria-Geral da União e aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, um mecanismo eficiente no registro e controle do gasto público, além da sanção à Lei 9.840/1999, de iniciativa popular, que pune a compra de votos e combate a corrupção eleitoral.
No governo Lula, no campo da transparência, registramos a criação do Portal da Transparência, a ampliação do governo eletrônico para prestação de serviços ao cidadão e do pregão eletrônico para promover as compras do governo, e o fortalecimento dos órgãos de controle, como ampliação das atribuições e responsabilidades da CGU, que passou a fiscalizar estados e municípios que recebem verbas federais.
No combate à corrupção e as fraudes eleitorais, também na gestão do governo Lula, cabe destacar a sanção: 1) à Lei 12.034/2009, que acrescenta parágrafos ao artigo 41-A da Lei 9.504/1997 para ampliar o prazo de denúncia e explicitar a captação do sufrágio, ao aceitar como conduta ilícita a evidência do dolo; 2) à Lei Complementar 131/2009, conhecida como Lei Capiberibe, que obriga todos os entes federativos (União, estados, Distrito Federal e os municípios) a debaterem com a sociedade suas propostas orçamentárias e tornarem públicas, em tempo real, todas as suas despesas; e 3) à Lei Complementar 135/2010, de iniciativa popular, conhecida como ficha limpa, que leva em consideração a vida pregressa dos candidatos no momento de sua inscrição como candidato às eleições.
Registre-se, ainda no governo Lula, o envio ao Congresso de uma série de projetos, recentemente transformados em lei, que permitem à sociedade, à imprensa e aos órgãos de controle o livre acesso a dados e informações. Ou seja, leis que facilitam a identificação e a denúncia de desvio de conduta ou prática de corrupção, bem como a punição e fornecem os meios para punição dos culpados.
No governo Dilma, podemos mencionar a sanção: 1) à Lei 12.525/2011, conhecida como Lei Geral de Acesso à Informação; 2) à Lei 12.813/2013, que trata do conflito de interesse; 3) à Lei 12.846/2013, que trata da responsabilização administrativa e civil da pessoa jurídica pela prática de atos contra a administração pública, possibilitando, pela primeira na legislação brasileira, a punição do corruptor.
No aspecto da transparência deve-se lembrar, ainda, a promulgação da Emenda à Constituição 76/2013, que aboliu o voto secreto na cassação de mandatos de parlamentares federais (deputado ou senador) e na apreciação de vetos presidenciais, permitindo ao representante conhecer os votos de seus representantes, inclusive em questões políticas.
Na dimensão do controle das ações multifacetadas do poder público – dentro do sistema de freios e contrapesos próprios da divisão das funções dos poderes – também devemos lembrar, nestes últimos anos, o fortalecimento de pelo menos cinco instituições, cuja missão é também o combate à corrupção: 1) as cortes de contas (TCU e tribunais de contas dos estados), 2) o Ministério Público, 3) os Sistemas e Controle Interno, 4) a Advocacia-Geral da União, e 5) a Controladoria-Geral.
O curioso é que, apesar de todos esses avanços na transparência, no controle e no combate à corrupção – que possibilitam maior participação política e a descoberta de desvios e punição dos culpados – a percepção das pessoas sobre este aspecto é de que o País se tornou mais corrupto e menos transparente.
Realmente é muito contraditório que na mesma proporção que o País avança na transparência e no controle sobre os agentes políticos – facilitando a descoberta e a punição dos desvios – aumente a desilusão e o descrédito com a política e com suas instituições, a ponto de as pessoas não apenas evitarem de participar mas desqualificarem a política.
Isso só pode ser atribuído à ausência de informação e formação sobre a política e suas instituições. Para suprir essa lacuna ou déficit de informação e participação é urgente que as escolas, a imprensa, os sindicatos, a sociedade e as instituições públicas e privadas invistam na educação política, com esclarecimento sobre o papel da política.
É preciso formar e educar para a cidadania. As pessoas precisam saber que todas as conquistas da humanidade foram resultados de decisões políticas e que a alternava à política é a barbárie. Quem imagina que o mercado substitui a política está redondamente enganado.
Assim, em lugar de negar ou desqualificar a política, as pessoas deveriam exigir instituições públicas capazes de impedir a corrupção e garantir participação, a representação e o controle sobre o interesse público e os direitos de cidadania.
Aliás, os que desdenham da política o fazem por ignorância ou má-fé. Os primeiros, infelizmente, são as potenciais vítimas do que defendem. E os segundos são os beneficiários, porque reservam para si ou para seus grupos os espaços de poder, por meio dos quais poderão definir as relações entre pessoas e entre estas e as instituições, excluindo desse processo a vontade popular.
Duas iniciativas são fundamentais para corrigir esses equívocos de percepção e contribuir para a melhoria do padrão ético na política: 1) a educação ou formação política, com esclarecimento sobre o que são, o que fazem e como funcionam as instituições, e 2) a mudança na legislação e na postura dos agentes políticos, que tem a obrigação de prestar contas e observar os princípios republicanos no exercício de seus mandatos.
Por todo o exposto, fica evidente que houve avanço na transparência, no controle no combate à corrupção, porém essa percepção, por má comunicação do governo e pela opção preferencial da grande mídia pelo escândalo ou espetáculo, não foi captada corretamente pela sociedade. O esforço, portanto, deve ser no sentido de fortalecer os mecanismos de controle e participação, mas sem desacreditar a política e suas instituições nem desestimular a participação cidadão no combate aos desvios.
Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap.