29

jun/2012

Fracasso da Rio+20

Terminou  em fracasso a Conferência da ONU para o Desenvolvimento Sustentável.  Foram gastos US$ 150 milhões para promovê-la. Dinheiro jogado fora.  Teria sido mais bem utilizado na preservação de florestas.

O  documento final, aprovado por 193 países, é pífio. Como nenhum país,  sobretudo os mais ricos, queria se comprometer com medidas de curto  prazo, o texto sofreu tantos cortes, para não desagradar a ninguém, que  desagradou até mesmo o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. No dia  seguinte, pressionado pelo Brasil, ele voltou atrás. Desdisse o que  tinha dito e defendeu o documento, no qual não foram levadas em conta as  sugestões da sociedade civil.

Nada de concreto foi decidido,  todos os compromissos pela sustentabilidade ficaram para depois…  Acordou-se que, no ano que vem, serão definidos os Objetivos de  Desenvolvimento Sustentável. Em 2014, a resolução de onde virão os  recursos para financiá-los. E a partir de 2015 devem ser implementados.

O  evento se equipara à crônica de uma morte anunciada. Os líderes dos  países ricos viraram as costas à Rio+20. Obama não veio. E ainda teve o  descaramento de enviar sua secretária de Estado, Hillary Clinton, apenas  no último dia, quando tudo já estava debatido e aprovado.

Em discurso inócuo, ela anunciou que os EUA destinarão
US$  20 milhões à proteção ambiental de países da África. Uma esmola,  sobretudo considerando que os EUA figuram, ao lado da China, como  principal culpado pela degradação da natureza.

O que a Rio-92  representou de avanço, a Rio+20 representa de retrocesso. Em 1992 foram  aprovadas a Carta da Terra, a Agenda 21 e três importantes convenções:  biodiversidade, desertificação e mudanças climáticas. A partir de então,  muitos países criaram ministérios do meio ambiente.

O entusiasmo  durou 10 anos. Em 2002, na Conferência de Johannesburgo, os governos se  recusaram a prestar contas do que haviam acordado no Rio. Já tinham  constatado que não há compatibilidade entre preservação ambiental e  modelo de desenvolvimento %u2014 predador e excludente %u2014 centrado  na acumulação privada do capital. Tivemos então uma década (2002-2012)  de conversa fiada.

A Rio+20 propôs aos governos, via G-77 (grupo  dos países menos desenvolvidos), criarem um fundo de US$ 30 bilhões para  financiar iniciativas de sustentabilidade em seus países. A proposta  não foi aprovada. Ninguém mexeu no bolso. Isso uma semana depois de o  G-20, no México, destinar US$ 456 bilhões para tentar sanar a crise na  Zona do Euro.

Não falta dinheiro para salvar bancos. Para salvar a  humanidade e a natureza, nem um tostão. Os donos do mundo e do dinheiro  vivem na ilusão de que a nave espacial chamada Planeta Terra possui,  como os voos internacionais, primeira classe e classe executiva.

O  fato é que os governos, com raras exceções, não estão interessados em  investir na sustentabilidade. Isso depende de um esforço a médio e longo  prazos. E governos buscam resultados propagáveis nas próximas eleições.

Sustentabilidade  é como saneamento. Segundo o Ministério das Cidades, 57% da população  brasileira não têm esgoto coletado. Como esgoto passa por debaixo do  solo, nossos políticos dão as costas, interessados no que traz  visibilidade.

Os governos querem desenvolvimento entendido como  multiplicação do capital. Nada de proteger a biodiversidade. Fingem não  se dar conta de que as mudanças climáticas decorrem da degradação da  biodiversidade.

A voracidade do capital venceu na Rio+20. Hoje, 7  bilhões de pessoas sobrevivem consumindo um planeta e meio. Em breve,  chegaremos a dois planetas. Como os recursos naturais são limitados, as  gerações futuras correm o sério risco de padecerem a carência de bens  essenciais, como água e alimentos.

A chuva que caiu sobre o Rio  durante o evento era como lágrimas de Gaia que, com certeza, tinha  esperança de que a Rio+20 a livrasse do estupro que sofre em mãos de  quem procura apenas tirar proveito dela, indiferente aos direitos das  gerações futuras.

Valeu estar ali e participar da Cúpula dos  Povos, onde povos indígenas se misturavam com ambientalistas, jovens e  crianças, para preservar ao menos a esperança de que vale a pena lutar  por um outro mundo possível e sustentável.

Autor: Frei Betto

COMPARTILHAR